No ecossistema dos serviços de hemoterapia brasileiros, qualidade não é simplesmente um conceito técnico ou um item a ser verificado em auditorias. Trata-se de um compromisso profundo com a excelência, a segurança do paciente e dos processos, e o respeito à vida humana em todos os elos do ciclo do sangue. O cotidiano dos profissionais do setor é desafiante e abrange desde limitações de recursos, diversidades regionais e diferenças epidemiológicas até a necessidade permanente de inovar tecnologicamente, cientificamente e na gestão.
Reconhecer que gestão técnica e gestão da qualidade caminham juntas é fundamental. Não se atinge excelência técnica sem processos sistematizados, capacitação, rastreabilidade e auditoria. Ao mesmo tempo, a busca pela qualidade só se sustenta com base em ciência, respeito à legislação, atenção às realidades locais e atualização constante.
Nesse universo dinâmico e colaborativo, o movimento Hemocentros Unidos se destaca ao estimular o compartilhamento, a inovação e o diálogo franco sobre desafios e soluções no setor. Promover a cooperação entre serviços públicos, privados e filantrópicos, valorizar a doação voluntária e disseminar práticas baseadas em evidências transforma o coletivo em agente de excelência nacional, alinhando-se ao propósito dos Hemocentros Unidos de fortalecer a hemorrede, inovar e estimular a cidadania em saúde.
A busca pela qualidade perpassa diferentes dimensões da rotina nos serviços de hemoterapia. Ela está presente em todos os processos, desde o atendimento e cuidado direto com doadores e pacientes, passando por procedimentos de suporte que garantem agilidade, rastreabilidade e infraestrutura ao dia a dia, até o planejamento estratégico que define metas, políticas, qualificação de pessoas e integração com a legislação vigente. A integração entre estes diferentes níveis é fundamental para promover não só a excelência técnica, mas também o fortalecimento da confiança institucional e da segurança transfusional.
Em relação ao marco regulatório, é importante destacar que a hemoterapia foi um dos primeiros campos da saúde brasileira a contar com legislações que inseriram, de forma pioneira, requisitos específicos de gestão da qualidade. Cumprir requisitos legais, como a Lei nº 10.205/2001 (Lei do Sangue), a RDC ANVISA nº 34/2014 e a Portaria de Consolidação nº 5, Anexo IV, é indispensável. Essas normas abrangem desde a rastreabilidade e controle de processos até a responsabilidade técnica e auditorias sistemáticas. Essa tradição regulatória sólida conferiu bases para um sistema cada vez mais seguro, monitorado e aberto à melhoria contínua. Entretanto, maturidade em qualidade vai além de cumprir normas: é transformar auditorias em oportunidades de aprendizado, fomentar a autocrítica construtiva, valorizar a cooperação e cultivar um ambiente institucional que encoraja a inovação e a excelência operacional.
A consolidação de uma cultura de qualidade nos serviços de hemoterapia exige liderança ativa, com gestores próximos das equipes, promovendo diálogo, ética e compromisso e inspirando pelo exemplo. É igualmente essencial criar ambientes que incentivem o protagonismo dos profissionais, pois todos os colaboradores, de diferentes áreas e funções, são fundamentais nesse processo. Investir em reconhecimento, formação continuada e escuta ativa eleva o desempenho, motiva as equipes e favorece um ciclo virtuoso de aprendizado e aprimoramento. O uso estruturado de ferramentas de gestão de riscos, metodologias como PDCA, Lean e Six Sigma, auditorias internas e acompanhamento de indicadores fundamenta decisões, promove correções e estimula a melhoria contínua. Além disso, o fortalecimento dessa cultura precisa estar alinhado a um foco sustentável, integrando dimensões ambiental, social e econômica, com uso racional de recursos, responsabilidade socioambiental e busca constante pela equidade no atendimento.
Caminhos para a Excelência
Cada bolsa de sangue representa vida, tornando a cultura da qualidade um requisito fundamental para a confiança, sustentabilidade e credibilidade dos serviços de hemoterapia. Integrar gestão técnica com gestão da qualidade é o caminho para fortalecer nossos serviços e garantir resultados consistentes e seguros.
Este é o início de uma série de artigos que irá aprofundar como a gestão da qualidade pode não apenas transformar processos, mas também inspirar mudanças significativas que beneficiam toda a sociedade.
Esta coluna, em sintonia com o propósito colaborativo dos Hemocentros Unidos, é um espaço aberto para troca, reflexão e construção coletiva na busca contínua pela excelência em toda a Hemorrede brasileira.
A cultura da qualidade é o elo que fortalece toda a rede de cuidado, salvando vidas e promovendo cidadania, onde o compromisso de cada profissional faz a diferença no cotidiano da saúde.